Sabe aquele papo de aproveitar o isolamento para o autoconhecimento e autocrítica? É exatamente isso que tenho feito e esse olhar tem se estendido para minha profissão e o mercado que atuo.
Eu amo a comunicação, a forma criativa com que as marcas usam suas redes sociais, ver o jornalismo no cerne das discussões políticas e de saúde pública. Eu também amo a publicidade que emociona e o marketing que torna o meio digital competitivo e possível para pequenos negócios, mas me preocupo. Me preocupo muito com o nosso mercado.
Desde o início da quarentena, há mais de 40 dias, tenho usado muito mais as redes sociais (acho que eu e todo mundo, certo?) e me surpreende a quantidade de receitas de bolo vendidas pelos profissionais de comunicação e marketing para uma problemática jamais vivida.
Sejamos sinceros. A gente sabe mesmo como sair de um cenário jamais vivido?
Em São Paulo, as ruas estão vazias (menos do que deveriam), os comércios não essenciais estão todos fechados e proibidos de funcionar, avenidas estão interditadas e não podemos – tampouco devemos – sair de casa. As empresas estão tentando se adequar ao trabalho remoto e aquelas que têm suas atividades totalmente concentradas no presencial estão buscando alternativas para não quebrar, já que o impacto negativo financeiro é inerente a grande parte da economia do mundo.
Sejamos sinceros. A gente sabe mesmo como sair de um cenário jamais vivido? Nunca vivemos uma quarentena, nunca tivemos os negócios tão ameaçados por perdas financeiras e de vidas. Nunca vimos discussões acerca do tema: salvar economias ou vidas?
Eu sei, eu sei. Em nossas formações aprendemos que precisamos oferecer ao cliente soluções de problemas que às vezes nem eles sabem que têm, mas será que não é pretensioso da nossa parte vender uma solução que ninguém tem para um problema nunca antes visto?
Oportunidade versus oportunismo
Eu acredito que uma ótima forma de entender a diferença entre oportunidade e oportunismo é pensar nos seguintes cenários: para uma costureira autônoma, a obrigatoriedade do uso de máscaras nas ruas e ambientes não controlados, como supermercados e farmácias é uma oportunidade de aumentar a produção e, consequentemente, o faturamento. Se uma loja for lá e comprar um lote de máscaras dessa costureira e vender por 10 vezes maior do que o valor praticado no mercado devido à alta demanda e baixa oferta é oportunismo.
Não tenho dúvidas de que a atual crise foi um empurrão para muitos negócios entrarem no digital, adotarem sistemas mais sustentáveis como o home office e essa cultura (forçada) impactará no mercado e será uma oportunidade para o segmento de comunicação e marketing. Porém vender cursos, e-books e mentorias com a promessa de ensinar um negócio a sair da crise é um tanto quanto pretensioso, oportunista e desonesto.
Esse oportunismo adotado por uma fatia de profissionais da nossa área gera um impacto negativo de credibilidade no nosso mercado que é bastante difícil de contornar e que já lidamos nos dias de hoje. Há seis anos à frente da HUG Comunicação perdi a conta das vezes que recebi ligações, solicitações de orçamento ou feedbacks de empresas que dizem que optaram por apostar uma última vez em comunicação, já que nunca tiveram boas experiências. Esse é o resultado da promessa de uma entrega discrepante com as nossas possibilidades, habilidades, formação e atuação. Acredite, isso acontece com mais frequência do que você pode imaginar.
Empregos estão sendo perdidos, hospitais estão lotados, mais de 7 mil vidas se foram, cidades brasileiras começando a adotar sistema de lockdown, um protocolo de emergência que impede que pessoas saiam de casa e apenas serviços essenciais abram, uma pandemia sem previsão de ter um fim.
Todos estamos em busca de soluções a todo momento, são nossos negócios, empregos, sustentos e comida na mesa que estão em jogo, assim como nossas vidas e dos nossos familiares. Não acredito que a resposta econômica esteja nas mãos de um guru do marketing com suas frases prontas, muito reflexivas e pouco efetivas.